XADREZ MEMÓRIA

Xadrez de memórias, histórias e (es)tórias, de canteiro, de sussurro, de muito poucos...

05/10/17

Michael Hanke


Conhecia algumas fotos de xadrez da sua lavra. Excelentes, um P/B tecnicamente perfeito e uma capacidade de captar o xadrez, a competição xadrezistica fora do comum e  heterodoxa.. Michael Hanke ganhou o 2ºPremio de Desporto da World Press Photo, o que não deixa de ser supreendente dentro de uma modalidade desportiva "estática" e pouco fotogénica.

Fotografias brilhantes as de Hanke. Apesar de não gostar muito que um artista fale da sua arte, percebo a explicação do fotógrafo: " Procurava encontrar emoção onde se prussupõe ela não existir", " As crianças que jogam xadrez não seguem as regras estritas dos adultos" , a competição xadrezistica ao vivo "não tem nada a ver com os computadores e o mundo virtual onde outras crianças encontram diversão. As crianças que jogam xadrez estão juntas, falam, abraçam o jogador derrotado".
Certo, tirando o lado poético que se quer ver. Existirá outro lado menos bonito  nos torneios de jovens que Hanke desconhece certamente e se calhar é o oposto desta poesia. 

E depois há qualquer coisa de estranho entre a poética discursiva do fotógrafo e a captação do momento. E uma foto tem, deve deixar o espírito livre da interpretação do espectador. Não sei porquê, mas se algumas fotos do Torneio Jovem na Republica Checa me fascinam pela ternura, pelo encantamento, curiosamente a foto vencedora tem qualquer coisa de perturbador, de presságio tal como uma outra em que um miúdo ( o mesmo?) exige com histeria quanto baste uma Dama negra no ar.

Gostava de entender porque tecnicamente perfeitas como arte fotográfica, acho estas fotos esteticamente feias, de uma agressividade de olhar que me incomoda. Talvez demasiada candura minha. Talvez o confronto na infância com o que passei a analisar mais calmamente no xadrez de compeição adulto e que inapelavelmente me afastou vai para muitos anos do tabuleiro. Olhares injetados de raiva, de rolo compressor, bafos fedorentos de bêbados inveterados ( uma vez até com filhos pequenos ao lado!) truques quase trapaças, quando não o ronceirismo mais grunho depois da partida terminada. Para mim chegava, chegou. Já não tinha idade, nem paciência, se calhar nem força para saltar da mesa e aplicar uma cabeçada bem assente no meio dos olhos de alguns graúdos e menos graúdos à maneira da Sé do Porto.

Pois...se calhar tinha escolhido mal a paixão. Talvez nunca percebesse nada de Xadrez. Ou talvez sim. Ou como compreendo a razão porque "ainda bem que...". Outro xadrez se me abriu as portas. E esse para sempre.